Em Frente da Porta | Do Lado De Fora
Uma abordagem à realidade dos Sem-Abrigo de Lisboa

A
mesma cidade que, plena de contrastes, se orgulha de ser o espaço de cultura,
de liberdade e de cidadania, de conforto e de qualidade de vida, que a colocam
nos lugares cimeiros dos rankings mundiais.
Bem
sabemos que a cidade gera um conjunto de vivências e de condições que propiciam
este fenómeno que, associado a outras problemáticas, como as patologias e as
dependências, torna a existência de SEM-ABRIGO,
uma quase inevitabilidade.
A
este fator, devemos, nos dias de hoje, acrescentar as novas
configurações sociais das populações em risco de exclusão e vulnerabilidade
social, que transformam a realidade dos sem-abrigo num fenómeno heterogéneo e
muito complexo, de difícil análise e de delicada observação.
A
não ser que, organismos públicos e privados concertem estratégias e definam uma
intervenção cuidada e continuada, avaliada de forma crítica e com a definição
clara de objetivos e prioridades.
As
pessoas que se encontram nesta situação estão, desde logo, privadas de exercer
os seus direitos básicos de cidadania, como o Direito à Morada e a sua própria existência enquanto cidadãos.
Estão afastados do acesso aos sistemas de informação de apoio e ao conjunto das
respostas sociais formais.
Sabemos
que, regra geral, os SEM-ABRIGO não
se dirigem aos serviços e quando o fazem, chocam com a rigidez dos mecanismos
de distanciamento, dos procedimentos e das regras que são criadas e impostas
pelas necessidades funcionais e interesses dos serviços e dos seus
profissionais…
Esta
forma de acolher representa uma barreira quase intransponível. Um obstáculo
perante o qual, a maioria dos que a ele recorrem, desiste.
Mas,
quem são estas pessoas? Quantos são aqueles que vivem nas ruas da nossa cidade?
A
ausência de números concretos e dados atualizados e credíveis sobre estes
nossos concidadãos (e também pelo facto de ser um fenómeno em constante
mutação), levou-se a estruturar uma intervenção que nos permitisse encontrar as
respostas e estas e outras questões, importantes e indispensáveis, para
podermos agir com rigor e com assertividade.
É
importante ir ao encontro do outro, penetrar no seu espaço e no seu mundo e
deixarmo-nos ir, para compreender o que está por detrás de cada gesto ou de
cada atitude, para perceber a linguagem do outro e a sua capacidade de
compreender o que comunicamos como verdades absolutas.
E
aí, ganhamos a confiança e estabelecemos o elo necessário que nos permite estar
presentes e observar como cada um, à sua maneira e por sua iniciativa, vai
desenhando o seu caminho e definindo o seu percurso.

Entendemos
este nosso trabalho como uma missão. Predispusemo-nos a ouvir, a criar
cumplicidades. Desejamos que todos possam usufruir deste estudo da realidade
dos sem-abrigo de Lisboa e encontrem nele um contributo positivo para o seu
trabalho.
Dignidade,
não é apenas garantir o acesso a bens e serviços. É também denunciar
publicamente as situações encontradas, dar voz e protagonismo aos próprios,
incentivar neles a vontade de participar e proporcionar as condições para que
decidam sobre as suas próprias vidas.
“É
no esforço que cada um de nós está predisposto a fazer e a capacidade que
tivermos de conhecer com profundidade a realidade em que estas pessoas vivem e
de quem com ela se relaciona, que estaremos à altura de efetivar uma
intervenção realista e qualificada, consistente e produtiva”.
João Marrana,
Lisboa, Janeiro de 2014
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