sábado, 27 de junho de 2015

TODOS CONTAMOS - Uma brevíssima reflexão sobre a forma como a sociedade vê os Sem.abrigo




Quando falamos de pessoas sem-abrigo, temos quase sempre presente a imagem de alguém descuidado, sem preocupações na sua aparência, mal vestido e que denota um enorme deficit de cuidados de higiene. A esta representação social, quase universal, surgem também associados os consumos de álcool ou de drogas, acentuando ainda mais os sinais de exclusão.
É também costume referir os sem-abrigo como pessoas que querem manter-se no seu canto, afastados da sociedade. Mais vulgar ainda é dizer-se que os sem-abrigo não querem sair da rua. Estão lá por opção e de lá não querem sair. 
Numa iniciativa inédita em Portugal, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) lançou, em 2012, o programa Intergerações, através do qual foi diagnosticado o isolamento social dos idosos de Lisboa. Um ano depois, entre Março e Dezembro de 2013, a SCML debruçou-se sobre a população sem-abrigo.
Mantivemos a mesma metodologia de ir ao encontro, ouvir, escutar e procurar respostas para tantas questões que permanecem por esclarecer e compreender, a começar pelas mais elementares de todas: Quantos são os sem-abrigo de Lisboa? e Quem são?
Procurámos sempre actuar de forma a prevenir situações (de novos casos de pessoas sem-abrigo) e a de estimular à sua participação activa e incutir um sentimento de perseverança, reforçar a auto-estima e fazer acreditar!
Procurámos ir ao encontro de todos, nos seus locais de pernoita, de estada ou mesmo de mendicidade. Rua-a-rua, beco-a-beco, arcada-a-arcada. De manhã, de tarde ou de noite, porque é-se sem abrigo todas as horas do dia.
Após oito meses de presença diária nas ruas da cidade, ficámos com outra perceção sobre os sem-abrigo. Podemos, hoje, traçar o retrato do sem-abrigo de Lisboa:
Homens, na sua maioria; poucos são os que não se cuidam ou que não se preocupam em manter a sua imagem e a sua higi- ene tratada. Não mais, por insuficiência de espaços e locais para o efeito, nos horários adequados à realidade de quem vive nas ruas da vida da cidade.
São muitos os que procuram apoio, e muitos os que não sabem onde pedir, de que forma ou mesmo o que pedir.
Um aspecto quase comum entre todos eles: na sua maioria, querem retomar a ligação à sociedade que é sua por direito, mas que uma qualquer situação os deixou “do lado de fora”
Encontrámos homens e mulheres que precisam de atenção. De alguém que os ajude a desenhar o seu caminho. Sem paternalismos, mas assente em bases sólidas de confiança e defesa da dignidade de cada ser humano e dos seus direitos inalienáveis.

Cada homem ou mulher tem uma história.
Vivida, na maioria dos casos, de uma forma dura e intensa. Terríveis realidades e experiencias que os trouxeram ao mundo da indiferença, onde nada contam, e do qual não querem fazer parte.

Há um intenso trabalho pela frente. Mais do que distribuir bens, temos de distribuir dignidade. Mais do que ter pena, é chegada a hora de transmitir confiança e exigir responsabilidades.


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